Richard Simonetti
ATO I – No Banco.
– Bom dia, moço.
– Bom dia. Em que posso servi-lo?
– Sou Chico Matoso. Tenho um pequeno sítio. Vim fazer um empréstimo para minha lavoura de batatas.
– É a primeira vez?
– Sim.
– Tudo bem. Prepararemos sua ficha e o senhor levará uma relação das providências necessárias.
ATO II – No sítio, quinze dias depois.
– Boa tarde, Chico.
– Boa tarde.
– Sou Jeremias, o encarregado do setor de empréstimos rurais no Banco. Você esteve lá, inscreveu-se e não apareceu mais. Algum problema?
– O senhor me desculpe, mas achei tudo muito complicado.
– Que é isso, meu amigo? Assustado com a papelada? Não é tão difícil... Se for até lá amanhã, prometo-lhe que resolveremos tudo num instante. O Banco tem interesse em ajudá-lo a melhorar de vida.
– Bem... se é assim, vou tentar. Estou precisando...
– Ótimo. Espero por você.
ATO III – No Banco, após cinco dias.
– Está tudo em ordem, Chico. Como lhe prometi, não houve demora. Agora só falta sua assinatura.
– Agradeço seu empenho, Jeremias, mas desta vez não tem jeito...
O problema é insolúvel...
–Sou analfabeto.
– Não sabe nem escrever seu nome?
– Não.
– Gosta de desenhar?
– Rabisco um pouco...
– Ótimo. Veja esta tira de papel. Eu a retirei da bobina, na máquina de somar. Escreverei seu nome várias vezes. Você vai copiar, como quem faz um desenho.
– Será que consigo?
– Claro. Tenho certeza.
– Bem, se me ajudar...
– Fique tranquilo! Vamos repetir tantas vezes quantas forem necessárias!
ATO IV – No Banco, vinte anos depois.
– Meus amigos, na condição de gerente, congratulo-me com a laboriosa população desta cidade que o Banco ajudou a desenvolver. Agradeço a presença de todos nesta reunião de confraternização e, em particular, do amigo Chico Matoso, o cliente que mais tem movimentado nossa carteira agrícola para financiamento de suas inúmeras lavouras.
– Peço licença ao nosso estimado chefe para dizer que minha presença aqui representa apenas o cumprimento de um dever de gratidão. Tudo o que tenho devo ao Banco e, mais exatamente, ao pessoal que me atendeu quando eu nem sabia escrever meu nome e possuía apenas pequeno sítio.
– Deve ter lembranças muito interessantes...
– Sim, particularmente uma, inesquecível. Vejam esta tira de papel amarelada que guardo em minha carteira há vinte anos. Foi nela que aprendi a desenhar meu nome para firmar o primeiro contrato com o Banco. Já não preciso dela. Alfabetizei-me. Mas guardo-a com muito carinho, como uma joia de inestimável valor. Ela é o testemunho da boa vontade de um homem admirável que foi chefe aqui. Deus o abençoe.
* * *
Costumamos situar como missionário o Espírito de elevada hierarquia que vem à Terra para grandiosas tarefas junto à Humanidade. No entanto, todos somos, potencialmente, missionários. Em qualquer setor de atividades podemos exercitar nobre missão, sempre que façamos de nossa profissão muito mais que simples “ganha-pão”, abençoado instrumento para beneficiar o semelhante.
Professora Leila, à esquerda, alfabetizando adultos. Casa da Caridade, Araçatuba, SP
Foto: Ismael Gobbo
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