Richard Simonetti
Desde que Freud desbravou o inconsciente, herdeiros de suas teorias, situados em variadas escolas psicológicas, tentam decifrar os enigmas da personalidade humana.
Poucos o fazem acertadamente. O próprio Freud, não obstante seu pioneirismo ou, talvez, por causa dele mesmo, andou tropeçando em idiossincrasias e excentricidades. Por outro lado, a falta de bases mais seguras para semelhantes pesquisas tem resultado na proliferação de teorias sobre comportamento que, assentadas sobre meras lucubrações literárias, inspiradas, sobretudo, na preocupação de originalidade, semeiam perturbadoras ideias em indivíduos menos esclarecidos.
Num ponto há unanimidade, assentada sobre um erro fundamental: pretender-se que os desajustes humanos são mera consequência de pressões exteriores ou circunstâncias existenciais. O psicoterapeuta surge, então, como uma espécie de detetive, a pesquisar, em acontecimentos do passado, a gênese dos males que afligem o paciente. Depois, à maneira de hábil “ferreiro”, martela sua personalidade com ilustrada verbosidade, no propósito de corrigir-lhe os desvios e levá-lo ao equilíbrio.
Raros os pacientes que, submetidos a semelhante tratamento, superam, plenamente, suas dificuldades. Nota-se que, enquanto permanecem sob influência dos médicos que os assistem, experimentam animadoras modificações, chegando a ensaiar um clima de euforia. Infelizmente é uma reação artificial, mero condicionamento que necessita ser renovado a cada sessão terapêutica, sob pena de recaídas frequentes. Com isso, o tratamento pode prolongar-se indefinidamente.
As ciências psicológicas prendem-se, assim, a estreitos limites. Não constataram, sequer, que o porão da individualidade, o inconsciente, é muito mais vasto do que imaginam, guardando não apenas o exíguo depósito de experiências da vida presente, mas todo um universo de vivências anteriores, que se perdem na noite dos séculos, iceberg gigantesco que deixa entrever ínfima parcela de seus segredos.
É esse vasto patrimônio de experiências nem sempre edificantes, e não raro comprometedoras, que exerce as pressões psicológicas desajustantes, originando fobias e compulsões, depressões e angústias, tensões e sofrimentos.
Os decantados traumas, que marcam, indelevelmente, o indivíduo, inibindo-o e infelicitando-o, atribuídos a acontecimentos chocantes ou à carência de afetividade nos primeiros anos de vida, guardam importância, intensidade e extensão compatíveis, acima de tudo, com sua bagagem cármica. Um incêndio, um acidente, uma agressão física, maus-tratos, pais indiferentes — tudo isso pode afetar lamentavelmente uma pessoa e nada significar para outra, porquanto a reação de ambas será sempre um processo de acomodação psicológica, orientada por sua posição evolutiva. Isto significa que, ante os males que nos afligem, somos vítimas, em primeiro lugar, de nós mesmos.
Talvez os discípulos de Freud consigam resultados melhores quando descobrirem a Reencarnação. Assenhoreando-se das técnicas de regressão de memória, sob indução hipnótica, poderão ter um quadro mais amplo, relacionado com os desajustes do paciente.
Somente a pesquisa demonstrará até que ponto essa iniciativa terá resultados satisfatórios, considerando-se que para o homem comum o esquecimento das vidas anteriores funciona como um mecanismo de defesa, já que ele não está suficientemente preparado para contemplar, sem graves prejuízos para seu psiquismo, as defecções passadas. Acresçam-se os problemas de relacionamento que fatalmente surgiriam de tal conhecimento, particularmente no lar, onde inúmeras dificuldades se originam na animosidade latente de inimigos ferrenhos colocados em convivência compulsória pela Sabedoria divina, a fim de transformar o ódio em amor.
Muito mais importante do que identificar os desvios do passado seria definir os rumos do presente, na procura de um caminho seguro, capaz de nos conduzir à sonhada estabilidade íntima, capacitando-nos a desfrutar, plenamente, dos patrimônios da Vida.
Jamais essa senda redentora foi tão maravilhosamente delineada como certo dia, há quase dois mil anos, quando o Sábio dos sábios, Mestre por excelência, falou a pequeno grupo de discípulos que, naquele instante, representavam a Humanidade inteira:
“Bem-aventurados os humildes, porque deles é o Reino dos Céus...” (Mateus, 5:3.)
Iniciava-se o Sermão da Montanha, no qual, em breves minutos, Jesus compôs, com a simplicidade da sabedoria autêntica e com a profundidade da verdade revelada, uma síntese das leis morais que regem a evolução humana.
Gandhi, o inesquecível líder hindu, dizia que o Sermão da Montanha é a mais bela página da Humanidade. Por si só preservaria os patrimônios espirituais humanos, ainda que se perdessem os livros sagrados de todas as religiões.
Renan, o demolidor exegeta do Evangelho, via no Sermão da Montanha a essência mais autêntica do Novo Testamento, a conter, em plenitude, a inconfundível moral do Cristo.
Dia virá em que ele fará parte dos currículos escolares, mostrando que não existe orientação mais segura, nem terapia mais eficiente para os desequilíbrios do comportamento humano do que a aplicação do sublime código moral contido nos princípios apresentados por Jesus.
O Sermão da Montanha. Imagem: http://en.wikipedia.org/wiki/File:Bloch-SermonOnTheMount.jpg
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